Apenas um ensaio

Acordo na Sexta-feira da Paixão ansioso: vou ensaiar com minha banda de rock no sábado de Aleluia.

Faz 2 anos que não tocamos. Também faz 6 meses que não ponho os dedos num baixo...

Corro para o computador e vejo o set list do último ensaio.
2 anos é muito tempo.
Não me lembro dos tons e seqüências de acordes da maioria das músicas. Também não me lembro das passagens e mudanças... E olha que sou o compositor de algumas dessas músicas!

Pego um baixolão, afino.

Começo a primeira música (tenho mp3 e acordes de todo set list) e aos poucos vou lembrando. Tocando umas 2 ou 3 vezes e já estou afiado, vou para segunda música. Terceira...
Quando minha esposa chama para almoçar já são 14h.

Como a música me faz desligar do mundo...

Só nessa hora percebo que estou com fome e que estou com bolhas nos dedos de minhas 2 mãos. Que merd.... Como vou ensaiar amanhã?

Depois do almoço, concluo que não poderei continuar a relembrar as músicas, pois as bolhas só irão piorar.

Pego no quartinho de música o case de meu velho baixo Fender Jazz Bass 83. Também faz 2 anos que não abro esse case.

As cordas estão verdes... Passo palha de aço para tirar a sujeira das cordas. Flanela no corpo. Limpando o baixo acariciando-o. Vendo que o branco do escudo já está amarelado.
Ao final, uso o afinador e somente uma das cordas está levemente desafinada. Impressionante!!! Depois de 2 anos.

Sábado acordo 4h da madrugada. Tenho que levar a esposa no Aeroporto em São Paulo que vai viajar a trabalho. 10 h estou de volta. Almoço e vejo que está tudo pronto: o baixo revisado e limpo, os cabos, afinador, a pasta com os acordes das músicas.

Nisso o interfone toca: é o tecladista que chega de São Carlos. O guitarrista vem de Curitiba e já trás o baterista que mora em São Paulo e chega 5 minutos depois.
Pegamos a estrada novamente e vamos para São José dos Campos onde está o estúdio já previamente contratado.

Que grande sacrifício é nos reunirmos para tocar...
Maldita falta de tempo! Maldita distância!
Quando crianças (12 anos), morávamos no mesmo bairro e a mãe do guitarrista tinha uma escola de música e ensaiar aos sábados era apenas pegar o baixo e andar um quarteirão para chegar na escola e escolher uma sala.
Como tínhamos tempo... Pena que não tínhamos a noção da importância de um ensaio aos 50 anos...
Estou nervoso. Os caras tocam muito, são ótimos músicos. Arrisco a dizer até que o tecladista e guitarrista são virtuoses.

Esqueci a pasta com os acordes... Que burro!!!
Fazer o que. Vamos que vamos...

E a mágica acontece. Como sempre!

Se o Paraíso existe, com certeza tem um estúdio e os caras de minha banda de rock estarão sempre lá. Sem distâncias, sem tempo, sem os problemas de saúde de um ou outro, e sem saudades...

18 h o ensaio termina, desmontamos os instrumentos, e vamos para uma pizzaria. Lembramos os shows em que tocamos. Damos muita risada.

Já são 22 h. Como está tarde. Como o tempo passou e não percebemos.
Os caras tem que pegar estrada e voltar para suas cidades.

Começa uma nova semana e estou no escritório, cheio de e-mails, telefone e stress... Mas estou com um sorriso besta na cara:
Como foi legal esse ensaio!!!

É muito tempo sem pegar um baixo.
Uma das coisas mais legais que tenho feito é o ensaio semanal.
As vezes fica até aquela sensação chata do compromisso toda semana, mas após o ensaio a alma fica lavada.
E não tenho como, na verdade acho que nem quero mais, ensaiar com os colegas dos primeiros tempos de banda, muito embora encontre com eles quase todos os dias (coisa de cidade pequena). O passado que fique nas boas lembranças, talvez um dia surja vontade de ressucitá-lo, não sei.
Por enquanto ainda acho bom conhecer novos colegas de gig, ensinar coisas aprender outras, se manter na ativa, novos ares renovam a gente, e bola prá frente.

que cronica Maurício, tomara que sempre aconteça bons ensaios assim.

Belo relato Maurício, eu ainda sou jovem e ensaio pelo menos 3 vezes por semana, depois de ler isso vou passar a apreciar mais o tempo que passo com meu amigos.

Muito bom, comigo a magia é parecida... amigos e música!

Também gosto muito de ensaiar, gosto de ver as músicas se formando, de discutir os arranjos, de tentar ajudar com ideias para as músicas. Também nem vejo as horas passarem e quando o ensaio acaba fico uma sensação de que ainda é cedo demais para ir embora. Belo texto Maurício, estou aguardando os próximos.